Sociedades Precapitalistas, vol. 11, e054, enero-diciembre 2021. ISSN 2250-5121
Universidad Nacional de La Plata
Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación
Centro de Estudios de Sociedades Precapitalistas (CESP)

Dossier "Los Campesinos en la Historia"

Apresentação do Dossiê

Mário Jorge da Motta Bastos

Universidade Federal Fluminense, Brasil
Cita sugerida: Bastos, M. J. da M. (2021). Apresentação do Dossiê. Sociedades Precapitalistas, 11, e054. https://doi.org/10.24215/22505121e054

Realidade social intrínseca e fundamental às sociedades pré-capitalistas até que o advento da sociedade burguesa fez com que “tudo que era sólido se desmanchasse no ar!”, os campesinatos constituem hoje uma força social dinâmica em especial em diversos países periféricos do mundo, alvos principais da concentração fundiária e da disseminação do agronegócio e um dos principais opositores do processo insidioso de subsunção real do campo e da agricultura ao capital. Organizados em associações várias de cunho local, nacional (MST, no Brasil) e internacional (Via Campesina), as comunidades camponesas revelam sua tenacidade na luta pelo acesso à terra e pela preservação dos seus quadros de vida comunitária e de solidariedade “aldeã”, assumindo a condição de protagonistas na resistência às formas ampliadas de reprodução do capital no campo. Não deixa de constituir, portanto, uma certa ironia que os campesinatos e trabalhadores rurais sem terra de hoje constituam a linha de frente das lutas anticapitalistas, esses que pareciam estar irremediavelmente condenados ao desaparecimento da face da terra e da História!

O dossiê que o leitor tem em mãos, e que tivemos a honrosa tarefa de organizar, constitui uma pequena demonstração do esforço coletivo assumido como tarefa primordial pelo Centro Ciro Cardoso de Pesquisa do Pré-Capitalismo (CCCP-Prék), de abordar em detalhe, e em perspectiva comparada, as diversas experiências históricas de estruturação das sociedades de base agrária, das formas de dominação sofridas e de resistência desenvolvidas pelos campesinatos ao longo da História, fomentando e apoiando a elaboração de uma história do “mundo camponês” que, inscrita na longa duração, desvele o seu protagonismo, fundamente a sua ação no tempo presente e apoie os seus (nossos!) anseios de futuro. Trata-se, portanto, de promover uma História camponesa, uma História que tenha por foco o desvendamento da longa e diversa experiência dos trabalhadores rurais, das formas de sua organização ao longo do tempo, da formação de suas comunidades, das sociabilidades que lhes eram características, dos vários regimes de exploração a que foram submetidos e dos mecanismos, estratégias e frentes de resistência e de luta que desenvolveram contra os mesmos.

Não se trata, contudo, de promover uma “essencialização” do campesinato, ou a sua “naturalização” sob uma perspectiva romântica que negue a sua historicidade, mas justamente de determinar os âmbitos fundamentais de sua existência histórica para, comparando os contextos dados pelas sociedades antigas, medievais, modernas e contemporâneas, considerar especificidades, identidades, níveis de convergência e divergência da experiência milenar dos campesinatos na História. Tarefa hercúlea, não há dúvida, porém menor – ainda que parte integrante sua, essa é nossa pretensão –, do que aquela que consiste em apoiar os movimentos campesinos da atualidade nas suas (nossas) lutas pela superação definitiva da era do capital.

Dentre os trabalhos aqui reunidos, o artigo de Carlos Tejerizo constitui um importante registro da vigorosa contribuição da Arqueologia para o conhecimento dos ambientes rurais na Alta Idade Média e, por extensão, das próprias condições de existência do campesinato do período. Focado no estudo das aldeias da meseta norte ibérica, o autor aborda a sua gênese nos primeiros séculos da Idade Média, submetendo a questionamento o clássico vínculo causal estabelecido entre o processo de aldeamento e a formação do feudalismo.

Eduardo Daflon, por sua vez, em seu artigo, após promover um balanço sobre o tema e lamentar a ausência de reflexões sistemáticas sobre o conceito de campesinato na historiografia medievalística – a despeito da recorrência de sua adoção pelos autores –, propõe vias alternativas plenas de possibilidades para a caraterização e abordagem daquele sujeito histórico alto-medieval.

Adentramos o mundo antigo, mais especificamente o da República Romana, com o artigo de José Knust. Segundo o autor, os textos antigos mencionam uma série de propostas de leis agrárias ao longo da sua história. Revisando o mais antigo ciclo de propostas de leis dessa natureza de que se tem notícia, estabelecidas entre 486 e 442 a.C., José Knust analisa a questão agrária da época, relacionando-a com as transformações do sistema agrário que a agricultura mediterrânica vivia naquele tempo e com as transformações na posição política do campesinato no contexto da emergência das cidades-estado mediterrânicas.

Já o artigo de Patrick Guzzo volta-se ao tema da hierarquização e das expressões da desigualdade social nas sociedades escandinavas da Era Viking. Centrado no estudo dos versos que constituem o poema intitulado Rigsþula (O conto de Rig), que integra a coletânea de texto da Edda Maior, o autor analisa os mitos que explicam o surgimento das diversas camadas sociais constitutivas das sociedades nórdicas, considerando os mecanismos de diferenciação dos setores sociais que compõem as elites e os grupos subalternos.

Renato Silva dedica o seu artigo ao debate do conceito de campesinato mobilizado pelos especialistas dedicados à história da Inglaterra. Remontando ao século XIX e impregnados de elementos nacionalistas, o autor pretende demonstrar que o(s) conceito(s) de campesinato e (mais amplamente) a visão da sociedade anglossaxã constitui uma visão germanista liberal que emergiu contraposta à proposição do germanismo formulada, na sua época, pelos nazistas.

Thiago Magela aborda o problema do tempo senhorial nos aforamentos realizados pela realeza portuguesa na segunda metade do século XIII. A análise dos documentos procura demonstrar que o “tempo natural” que foi submetido ao “santoral” pela Igreja convergiu no processo de afirmação da realeza na medida em que conectou simbolicamente o rei e os santos ao momento de pagamento das rendas, processo esse que designa por “temporalização do poder”.

Por fim, o artigo de Uiran Gebara tem como problema central a compreensão dos padrões de vida das comunidades rurais do Norte da Gália tardo-romana. O autor inicia por uma reflexão teórica sobre as definições conceituais utilizadas e o impacto da mudança de paradigma no estudo da sociedade e economia tardo-romana sobre o estudo das comunidades rurais. Põe em questão, em seguida, a cultura material das regiões rurais em termos de fenômenos visíveis e invisíveis; analisa dados oriundos de estabelecimentos rurais; propõe modelos de interpretação das relações sociais, econômicas e culturais dessas regiões da Gália romana; e conclui com a proposição de modelos e categorias que possam representar de forma mais complexa suas formas de organização comunitária.

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